quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A Fúria

Li à pouco tempo o livro Fúria de Salman Rushdie, de referir que que Rushdie é o meu escritor favorito.
Fazendo uma pesquisa nas prateleiras da biblioteca da Mealhada para ver se encontrava um livro que me desafiasse para a leitura, eis então que me surge no horizonte visual o livro de Rushdie. O livro apresenta-se como estando ao nível de Ulisses de James Joyce. Mesmo adorando Rushdie, desconfiei desta comparação, mas decidi arriscar nesta aventura literária, sim aventura, ler Rushdie é para mim uma aventura.
O livro conta a história de Malik Solanka, um professor à procura de um rumo para a sua vida, procurando este rumo em Nova York, a cidade onde desembarca tudo o que a nossa sociedade contemporânea fabrica, desde o material ao espiritual e onde todas as culpas e ódios do mundo acabam por desaguar.
Solanka é o homem contemporâneo em busca de si próprio na grande metrópole Nova Yorkina, que vai encontrar as respostas ás suas questões no amor de uma mulher e numa nação em guerra, do outro lado do mundo.
O livro descreve muito bem a cidade e o misto cultural que lá vive, as guerras que se formam entre as diferentes etnias. É um retrato cruo, sombrio e perturbador da nossa sociedade, que nos faz perguntar para onde caminhamos.
"(...) o verdadeiro problema eram os danos não da máquina mas do coração desejoso, e a linguagem do coração estava a perder-se. A questão era um excesso de danos do coração, não a tonificação dos músculos, não a comida, nem o feng shui nem o karma, nem a impiedade nem Deus. Era esta Doença dos Nervos que deixava as pessoas ensandecidas: excesso não de bens de consumo mas de esperanças desfeitas e frutradas. Aqui na América (...) as expectativsas humanas nunca tinham estado tão altas na história humana, e o mesmo acontecia, é claro, com as decepções humanas. Quando incendiários punham o Oeste a arder, quando um homem pegava numa espingarda e desatava a matar amigos, (...) esta decepção era demasiado fraca, era o motor que dirigia a expressividade-de-língua-presa dos assassinos. Este era o único tema: o esmagar de sonhos numa terra em que o direito a sonhar era a pedra angular da ideologia nacional (...)"
  • "A perfectibilidade do Homem não é mais, poder-se-ia dizer, que uma piada de mau gosto de Deus";
  • "O Estado não pode fazer-nos felizes (...) não pode tornar-nos pessoas boas ou curar-nos de um desgosto de amor. O Estado gere escolas, mas será que pode ensinar os nossos filhos a gostar de ler, ou será essa nossa função? Há um Serviço Nacional de Saúde, mas que pode ele fazer em relação à enorme percentagem de pessoas que vai ao médico precisar? Há bairros sociais, claro, mas a boa vizinhança não é uma questão governamental.";
  • "Se a cultura era o novo secularismo do mundo, então a nova religião era fama e a indústria- ou melhor, a Igreja,- da celebridade viria dar trabalho sério a uma nova ecclesia, uma missão de proselitismo destinada a conquistar esta nova fronteira, (...) desenvolvendo novos combustíveis a partir da má-língua e levando os Escolhidos até às estrelas.";
  • "Há uma nova hipersensibilidade cultural, um modo quase patológico de ofender.";
  • "Viver na metrópole era saber que o excepcional era tão comum como um refrigerante sem açúcar, que a anormalidade era a norma da pipoca.";
  • "(...) a ignorância, desde que apoiada numa quantidade suficiente de dólares, se tornava sabedoria.";
  • "Uma cidade de meias-verdades e ecos, que domina, vá-se lá saber como, a Terra.";
  • " O Paraíso, era um lugar de que só as pessoas com mais pinta e mais massa em Nova Iorque possuiam o número secreto.";
  • "A necessidade de a América, tornar as coisas americanas, era a marca de uma estranha insegurança.";
  • "Quando os vivos chegam a acordo dentro de si mesmos em estarem mortos, então começa a fúria tenebrosa. A fúria tenebrosa da vida, recusando-se a morrer antes do tempo destinado.";
  • "Qualquer americano que se preze conhece os nomes, pelo menos, de meia dúzia de medicamentos eficaz na gestão de humores."